Comentando o TCU nº 12. Acórdão nº 1587/2023 – Plenário. 13.09.2023.
Jurisprudência:
Acórdão 1587/2023 Plenário (Relatório de Auditoria, Relator Ministro Antonio Anastasia) Contrato Administrativo.
A utilização de reajuste contratual com prazo inicial a partir da assinatura do contrato está em desacordo com o art. 40, inciso XI, da Lei 8.666/1993 e com a jurisprudência do TCU.
Comentário LCT:
A equação econômico-financeira é um direito garantido ao particular que é contratado pela Administração, conforme estatuído no art. 37, inc. XXI, da Constituição Federal,[1] que assegura expressamente a preservação das condições efetivas da proposta do fornecedor no decorrer de todo o contrato.[2]
O direito ao reajuste contratual sempre esteve assegurado no art. 40, inc. XI, da Lei nº 8.666/1993, aplicável anualmente, contando-se a partir da data da apresentação da proposta pelo fornecedor ou do orçamento que a proposta se referir.[3]
No mesmo sentido, a Lei nº 14.133/2021 (Nova Lei de Licitações), concretiza esse direito no art. 6º, inc. LVIII, no art. 25, § 7º e art. 136, diferenciando-se do previsto na Lei nº 8.666/1993, apenas em relação ao início da contagem do prazo para o direito ao reajuste – data-base vinculada à data do orçamento estimado..[4]
Segundo Marçal Justen Filho, “o reajuste é procedimento automático, em que a recomposição se produz sempre que ocorra a variação de certos índices, independente de averiguação efetiva do desequilíbrio. Aprofundando os conceitos, o reajuste consiste em consequência de uma espécie de presunção absoluta de desequilíbrio.”[5]
Independentemente da norma utilizada pela Administração Pública, Lei nº 8.666/1993 ou Lei nº 14.133/2021, evidencia-se que a contagem do prazo para o direito ao reajuste não pode ser considerada a data da assinatura do contrato. Foi justamente esse o entendimento proferido pelo Tribunal de Contas da União – TCU no Acórdão ora em análise:
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- Quanto à última questão, a equipe identifica dois achados de auditoria: a) existência de atrasos que podem comprometer o prazo de entrega do empreendimento (IGC); e b) cláusulas contratuais em desacordo com a Lei 8.666/1993 e a jurisprudência do TCU (F/I) – previsão contratual de que ‘somente ocorrerá reajustamento do Contrato decorrido o prazo de 24 (vinte e quatro) meses contados da data da sua assinatura’.
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[…]
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- O art. 40, inciso XI, da Lei 8.666/1993, estabelece que os editais de licitação indicarão obrigatoriamente critério de reajuste, que deverá retratar a variação efetiva do custo de produção, admitida a adoção de índices específicos ou setoriais, desde a data prevista para apresentação da proposta, ou do orçamento a que essa proposta se referir, até a data do adimplemento de cada parcela.
- No mesmo sentido, o art. 25, § 7º, da nova Lei de Licitações e Contrato Administrativos, Lei 14.133/2021, prevê que será obrigatória, independentemente do prazo de duração do contrato, a previsão no edital de índice de reajustamento de preço, com data-base vinculada à data do orçamento estimado e com a possibilidade de ser estabelecido mais de um índice específico ou setorial, em conformidade com a realidade de mercado dos respectivos insumos.[6]
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Ainda sobre o direito ao reajuste contratual, destaca-se que a Lei nº 8.666/1993 e a Lei nº 14.133/2021 disciplinam sobre a obrigatoriedade de previsão de cláusula contratual relacionada ao tema.[7]
O TCU já se manifestou sobre o caráter automático do reajuste em sentido estrito, aduzindo que:
A diferença entre repactuação e reajuste é que este é automático e deve ser realizado periodicamente, mediante a simples aplicação de um índice de preço, que deve, dentro do possível, refletir os custos setoriais. Naquela, embora haja periodicidade anual, não há automatismo. pois é necessária a demonstração da variação dos custos do serviço.[8]
Entende-se que, por força de previsão constitucional e legal, mesmo que o contrato ou edital não versem sobre o reajuste do contrato administrativo, o direito do fornecedor está resguardado para a adequada manutenção das condições da proposta. E o TCU reafirma sua jurisprudência na linha de que o índice de reajuste se aplica a cada período de 12 (doze) meses, com marco inicial a partir da data da proposta ou orçamento vinculado (Lei nº 8.666/1993) ou da data do orçamento estimado na licitação (Lei nº 14.133/2023).
O regular adimplemento das obrigações estatais se presta a beneficiar o próprio Poder Público. Caso os administrados tivessem que suportar os ônus na relação com a Administração, sem equidade mínima, as propostas nas licitações passariam a considerar os custos da inadimplência estatal e ser mais onerosas. Por consequência, os preços se tornariam cada vez mais altos.
De outro lado, a insistente negativa de reequilíbrio, com entendimentos contrários à lei, ocasiona desinteresse dos particulares em contratar com a Administração Pública. Hodiernamente, a costumeira inadimplência de muitos entes públicos tem afastado as melhores empresas dos contratos administrativos.
O direito constitucional de manutenção das condições efetivas da proposta, mediante preservação da equação econômico-financeira, consubstancia-se em expressão do interesse público, na proporção em que incentiva as melhores empresas a prestarem serviços, com maior qualidade e menor preço.
[1] CF: […]. “Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: […] XXI – ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações”. Grifos não constam do original.
[2] O Direito, preservando a harmonia que lhe é implícita como sistema, ao retirar do contratado a garantia do pacta sunt servanda, erigiu outra, juridicamente relevante, que valoriza a participação do contratado-colaborador, ao lhe garantir a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro do contrato. No Brasil, inovadoramente, a Constituição Federal de 1988 assegurou ao contratado a manutenção das condições efetivas da proposta e a Medida Provisória nº 1.820, de 05 de abril de 1999, estabeleceu que são nulas de pleno direito as estipulações usuárias estabelecidas em situação de vulnerabilidade da parte, garantindo-se ao contratado o restabelecimento do equilíbrio da relação contratual, isso para qualquer contrato que não seja disciplinado pelas legislações comercial e de defesa do consumidor, devendo a parte requerer a adequação do contrato ao judiciário. Em particular, o ordenamento jurídico vem consagrando, por meio de uma série de instrumentos normativos, a garantia das condições efetivas da proposta, conforme a Constituição Federal, art. 37, XXI, valendo recordar: o edital deve prever critério de reajuste, tendo por dies a quo a data prevista para a apresentação da proposta ou do orçamento a que esta se referir […] JACOBY FERNANDES, Jorge Ulisses. Contratação Direta sem Licitação. 9. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2011, pág. 707.
[3] Lei nº 8.666/1993: […] Art. 40. O edital conterá no preâmbulo o número de ordem em série anual, o nome da repartição interessada e de seu setor, a modalidade, o regime de execução e o tipo da licitação, a menção de que será regida por esta Lei, o local, dia e hora para recebimento da documentação e proposta, bem como para início da abertura dos envelopes, e indicará, obrigatoriamente, o seguinte: […] XI – critério de reajuste, que deverá retratar a variação efetiva do custo de produção, admitida a adoção de índices específicos ou setoriais, desde a data prevista para apresentação da proposta, ou do orçamento a que essa proposta se referir, até a data do adimplemento de cada parcela;
[4] Lei nº 14.133/2021: […] Art. 6º Para os fins desta Lei, consideram-se: […] LVIII – reajustamento em sentido estrito: forma de manutenção do equilíbrio econômico-financeiro de contrato consistente na aplicação do índice de correção monetária previsto no contrato, que deve retratar a variação efetiva do custo de produção, admitida a adoção de índices específicos ou setoriais; […] Art. 25. O edital deverá conter o objeto da licitação e as regras relativas à convocação, ao julgamento, à habilitação, aos recursos e às penalidades da licitação, à fiscalização e à gestão do contrato, à entrega do objeto e às condições de pagamento. […] § 7º Independentemente do prazo de duração do contrato, será obrigatória a previsão no edital de índice de reajustamento de preço, com data-base vinculada à data do orçamento estimado e com a possibilidade de ser estabelecido mais de um índice específico ou setorial, em conformidade com a realidade de mercado dos respectivos insumos. […] Art. 136. Registros que não caracterizam alteração do contrato podem ser realizados por simples apostila, dispensada a celebração de termo aditivo, como nas seguintes situações: I – variação do valor contratual para fazer face ao reajuste ou à repactuação de preços previstos no próprio contrato;
[5] JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 16i1 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014. p. 748.
[6] TCU – Acórdão nº 1587/2023 – Plenário
[7] Lei nº 8.666/1993: […] Art. 55. São cláusulas necessárias em todo contrato as que estabeleçam: […] II – o preço e as condições de pagamento, os critérios, data-base e periodicidade do reajustamento de preços, os critérios de atualização monetária entre a data do adimplemento das obrigações e a do efetivo pagamento;
Lei nº 14.133/2021: […] Art. 92. São necessárias em todo contrato cláusulas que estabeleçam: […] V – o preço e as condições de pagamento, os critérios, a data-base e a periodicidade do reajustamento de preços e os critérios de atualização monetária entre a data do adimplemento das obrigações e a do efetivo pagamento;
[8] TCU – Acórdão nº 1374/2006 – Plenário.
[1] https://www.gov.br/pncp/pt-br
[2] Lei nº 14.133/2021: […] Art. 1º Esta Lei estabelece normas gerais de licitação e contratação para as Administrações Públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e abrange: I – os órgãos dos Poderes Legislativo e Judiciário da União, dos Estados e do Distrito Federal e os órgãos do Poder Legislativo dos Municípios, quando no desempenho de função administrativa; II – os fundos especiais e as demais entidades controladas direta ou indiretamente pela Administração Pública.
[3] DO PORTAL NACIONAL DE CONTRATAÇÕES PÚBLICAS (PNCP) Art. 174. É criado o Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP), sítio eletrônico oficial destinado à: I – divulgação centralizada e obrigatória dos atos exigidos por esta Lei; II – realização facultativa das contratações pelos órgãos e entidades dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário de todos os entes federativos. § 1º O PNCP será gerido pelo Comitê Gestor da Rede Nacional de Contratações Públicas, a ser presidido por representante indicado pelo Presidente da República e composto de: I – 3 (três) representantes da União indicados pelo Presidente da República; II – 2 (dois) representantes dos Estados e do Distrito Federal indicados pelo Conselho Nacional de Secretários de Estado da Administração; III – 2 (dois) representantes dos Municípios indicados pela Confederação Nacional de Municípios. § 2º O PNCP conterá, entre outras, as seguintes informações acerca das contratações: I – planos de contratação anuais; II – catálogos eletrônicos de padronização; III – editais de credenciamento e de pré-qualificação, avisos de contratação direta e editais de licitação e respectivos anexos; IV – atas de registro de preços; V – contratos e termos aditivos; VI – notas fiscais eletrônicas, quando for o caso. § 3º O PNCP deverá, entre outras funcionalidades, oferecer: I – sistema de registro cadastral unificado; II – painel para consulta de preços, banco de preços em saúde e acesso à base nacional de notas fiscais eletrônicas; III – sistema de planejamento e gerenciamento de contratações, incluído o cadastro de atesto de cumprimento de obrigações previsto no § 4º do art. 88 desta Lei; IV – sistema eletrônico para a realização de sessões públicas; V – acesso ao Cadastro Nacional de Empresas Inidôneas e Suspensas (Ceis) e ao Cadastro Nacional de Empresas Punidas (Cnep); VI – sistema de gestão compartilhada com a sociedade de informações referentes à execução do contrato, que possibilite:a) envio, registro, armazenamento e divulgação de mensagens de texto ou imagens pelo interessado previamente identificado; b) acesso ao sistema informatizado de acompanhamento de obras a que se refere o inciso III do caput do art. 19 desta Lei; c) comunicação entre a população e representantes da Administração e do contratado designados para prestar as informações e esclarecimentos pertinentes, na forma de regulamento; d) divulgação, na forma de regulamento, de relatório final com informações sobre a consecução dos objetivos que tenham justificado a contratação e eventuais condutas a serem adotadas para o aprimoramento das atividades da Administração. § 4º O PNCP adotará o formato de dados abertos e observará as exigências previstas na Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011.
[4] Lei nº 14.133/2021: […] Art. 94. A divulgação no Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP) é condição indispensável para a eficácia do contrato e de seus aditamentos e deverá ocorrer nos seguintes prazos, contados da data de sua assinatura: I – 20 (vinte) dias úteis, no caso de licitação; II – 10 (dez) dias úteis, no caso de contratação direta. § 1º Os contratos celebrados em caso de urgência terão eficácia a partir de sua assinatura e deverão ser publicados nos prazos previstos nos incisos I e II do caput deste artigo, sob pena de nulidade. § 2º A divulgação de que trata o caput deste artigo, quando referente à contratação de profissional do setor artístico por inexigibilidade, deverá identificar os custos do cachê do artista, dos músicos ou da banda, quando houver, do transporte, da hospedagem, da infraestrutura, da logística do evento e das demais despesas específicas. § 3º No caso de obras, a Administração divulgará em sítio eletrônico oficial, em até 25 (vinte e cinco) dias úteis após a assinatura do contrato, os quantitativos e os preços unitários e totais que contratar e, em até 45 (quarenta e cinco) dias úteis após a conclusão do contrato, os quantitativos executados e os preços praticados.
[5] Lei nº 14.133/2021: […] Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei. § 1º A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, dispondo sobre: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) […] III – licitação e contratação de obras, serviços, compras e alienações, observados os princípios da administração pública;
[6] Lei nº 14.133/2021: […] Art. 1º Esta Lei estabelece normas gerais de licitação e contratação para as Administrações Públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e abrange: […] § 1º Não são abrangidas por esta Lei as empresas públicas, as sociedades de economia mista e as suas subsidiárias, regidas pela Lei nº 13.303, de 30 de junho de 2016, ressalvado o disposto no art. 178 desta Lei.
[7] Lei nº 13.303/2016: Art. 74. É permitido a qualquer interessado o conhecimento dos termos do contrato e a obtenção de cópia autenticada de seu inteiro teor ou de qualquer de suas partes, admitida a exigência de ressarcimento dos custos, nos termos previstos na Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011 .
[8] Lei nº 12.527/2011: […] Art. 8º É dever dos órgãos e entidades públicas promover, independentemente de requerimentos, a divulgação em local de fácil acesso, no âmbito de suas competências, de informações de interesse coletivo ou geral por eles produzidas ou custodiadas. § 1º Na divulgação das informações a que se refere o caput, deverão constar, no mínimo: […] IV – informações concernentes a procedimentos licitatórios, inclusive os respectivos editais e resultados, bem como a todos os contratos celebrados; […] § 2º Para cumprimento do disposto no caput, os órgãos e entidades públicas deverão utilizar todos os meios e instrumentos legítimos de que dispuserem, sendo obrigatória a divulgação em sítios oficiais da rede mundial de computadores (internet).
[9] Lei nº 14.436/2022: […] Art. 17. Os órgãos e as entidades integrantes dos Orçamentos Fiscal, da Seguridade Social e de Investimento deverão disponibilizar informações atualizadas referentes aos seus contratos no Portal Nacional de Contratações Públicas, de que trata a Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021, e às diversas modalidades de transferências operacionalizadas na Plataforma +Brasil, inclusive com o georreferenciamento das obras e a identificação das categorias de programação e fontes de recursos, observadas as normas estabelecidas pelo Poder Executivo federal.
[10] TCU – Acórdão nº 585/2023 Plenário