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Garantia de Proposta na Nova Lei de Licitações

A Nova Lei de licitações (Lei nº 14.133/2021) permite que os editais exijam, dos licitantes ou dos contratados a apresentação de garantias no seguinte formato:

      1. garantia de proposta (art. 58 da Lei nº 14.133/2021): para demonstrar a seriedade da proposta do licitante e resguardar a Administração em caso de eventual não assinatura do contrato por parte da empresa vencedora;[1] e
      2. garantia contratual (art. 96 e seguintes da Lei nº 14.133/2021): para resguardar a Administração em caso de eventuais descumprimentos no decorrer da execução do contrato. [2]

São espécies de garantias, tanto de proposta quanto a contratual, a caução em dinheiro ou em títulos da dívida pública, o seguro-garantia, a fiança bancária e o título de capitalização, as quais serão escolhidas pelo licitante ou contratado, não pela Administração.[3]

O art. 58 da Lei nº 14.133/2021 permite que a garantia de proposta seja de até 1% (um por cento) do valor estimado da licitação. De forma distinta, a garantia contratual será limitada a 5% (cinco por cento) do valor inicial do contrato, permitindo-se sua majoração para 10% (dez por cento), desde que haja justificativa baseada na complexidade técnica e nos riscos envolvidos.[4] Em caso de obras e serviços de engenharia de grande vulto o percentual pode ser equivalente a até 30% (trinta por cento) do valor inicial do contrato.

Especificadamente sobre a garantia de proposta, verificam-se alterações consideráveis na Nova Lei de Licitações sobre o momento de sua apresentação pelo licitante, quando comparado com o disposto na revogada Lei nº 8.666/1993.

A Nova Lei de Licitações, em seu art. 17, elenca as seguintes fases[5] da licitação: preparatória; de divulgação do edital de licitação; de apresentação de propostas e lances, quando for o caso; de julgamento; de habilitação; recursal; e de homologação.

Nos termos da Instrução Normativa SEGES/ME nº 73/2022 do Ministério da Economia, normativo que regulamenta a Lei nº 14.133/2021 na esfera federal e dispõe sobre as licitações eletrônicas de bens, serviços e obras, com base no menor preço ou maior desconto, o momento de envio de documentos relacionados à proposta e habilitação será após a disputa de preços.

Nesse sentido, o licitante não anexa documentos no momento do cadastramento da proposta no sistema, apenas preenche informações relacionadas ao objeto ofertado e ao preço.[6]

As fases da licitação previstas na Nova Lei de Licitações diferem das que eram definidas na Lei nº 8.666/1993, tendo em vista que a habilitação antecedia o momento de apresentação de proposta. Além disso, existiam duas etapas de recurso, uma após a análise de documentação dos licitantes e outra posteriormente a verificação das propostas dos concorrentes [7]

Além disso, o art. 31 da Lei nº 8.666/1993 definia o momento de apresentação da garantia de proposta na fase de habilitação, quando do envio dos documentos relacionados à qualificação econômico-financeira.[8] Com base no mencionado normativo, os órgãos de controle possuíam o entendimento de ser inviável a cobrança de garantia de proposta antes da fase de habilitação, para não permitir o conhecimento antecipado das empresas que efetivamente participariam do certame.[9]

A Lei nº 14.133/2021, por sua vez, dispõe que o momento de apresentação da garantia da proposta, caso seja exigida no edital, será antes da fase de habilitação, conjuntamente com o envio da proposta:

      • Art. 58: Poderá ser exigida, no momento da apresentação da proposta, a comprovação do recolhimento de quantia a título de garantia de proposta, como requisito de pré-habilitação.
        Parágrafo 1º: A garantia de proposta não poderá ser superior a 1% (um por cento) do valor estimado para a contratação.

A análise ao dispositivo acima, pode induzir a conclusões equivocadas de que o licitante somente participará da licitação se apresentar a garantia de proposta antes da abertura da sessão pública, no cadastro inicial da proposta no sistema eletrônica.

Tal entendimento, além de contrariar determinação expressa de apresentação de documentação apenas após o término da disputa de preços, ocasionaria a indevida violação do sigilo das propostas dos concorrentes.

A Lei nº 14.133/2021 disciplina que as licitações não serão sigilosas, exceto ao conteúdo das propostas, até a respectiva abertura:

      • Art. 13. Os atos praticados no processo licitatório são públicos, ressalvadas as hipóteses de informações cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado, na forma da lei.
        Parágrafo único. A publicidade será diferida:
        I – quanto ao conteúdo das propostas, até a respectiva abertura;

A IN nº 73/2022 reforça o entendimento de que durante a sessão pública é vedada a identificação do licitante:

      • Art. 21:  Iniciada a fase competitiva, observado o modo de disputa adotado no edital, nos termos do disposto no art. 22, os licitantes poderão encaminhar lances exclusivamente por meio do sistema eletrônico.
        […]
      • Parágrafo 6º: Durante a sessão pública, os licitantes serão informados, em tempo real, do valor do melhor lance registrado, vedada a identificação do licitante.

Por fim, importante evidenciar que o Código Penal considera crime a violação do sigilo da proposta em licitações:

Violação de sigilo em licitação
Art. 337-J. Devassar o sigilo de proposta apresentada em processo licitatório ou proporcionar a terceiro o ensejo de devassá-lo:
Pena – detenção, de 2 (dois) anos a 3 (três) anos, e multa.

A Corte de Contas Federal, na 5ª Edição do Livro Licitações e Contratos – Orientações e Jurisprudência do TCU –, aponta como risco de violação ao sigilo das propostas a exigência de apresentação de garantia de proposta antes do início da sessão pública:

[…] Exigência de que os licitantes forneçam a garantia de participação antes da apresentação das propostas, levando ao conhecimento antecipado, pela Administração, da identidade dos concorrentes, com consequente ilegalidade por redução indevida do prazo legal conferido aos licitantes para apresentarem as garantias, violação do sigilo e da impessoalidade do certame e criação de ambiente propicio a formação de conluios.[10]

Nesse contexto, mostra-se indevida a exigência editalícia, por parte do órgão ou entidade contratante, de apresentação de garantia de proposta antes do início da sessão pública, tendo em vista a consequente identificação dos licitantes de forma precária, com violação do sigilo da proposta e da impessoalidade do certame, além da criação de ambiente propicio a formação de conluios e outras irregularidades.

Necessário reforçar, portanto, que o momento de apresentação da garantia da proposta, quando exigida no edital, deverá ocorrer junto com a apresentação da proposta de preços. Já a garantia de contrato é exigida após a licitação, na fase de entrega dos bens ou execução dos serviços contratados.


[1] Lei nº 14.133/2021: […] Art. 58. Poderá ser exigida, no momento da apresentação da proposta, a comprovação do recolhimento de quantia a título de garantia de proposta, como requisito de pré-habilitação. § 1º A garantia de proposta não poderá ser superior a 1% (um por cento) do valor estimado para a contratação. […] § 3º Implicará execução do valor integral da garantia de proposta a recusa em assinar o contrato ou a não apresentação dos documentos para a contratação. […]. Art. 90. A Administração convocará regularmente o licitante vencedor para assinar o termo de contrato ou para aceitar ou retirar o instrumento equivalente, dentro do prazo e nas condições estabelecidas no edital de licitação, sob pena de decair o direito à contratação, sem prejuízo das sanções previstas nesta Lei. […] § 5º A recusa injustificada do adjudicatário em assinar o contrato ou em aceitar ou retirar o instrumento equivalente no prazo estabelecido pela Administração caracterizará o descumprimento total da obrigação assumida e o sujeitará às penalidades legalmente estabelecidas e à imediata perda da garantia de proposta em favor do órgão ou entidade licitante.

[2] Lei nº 14.133/2021: […]  Art. 96. A critério da autoridade competente, em cada caso, poderá ser exigida, mediante previsão no edital, prestação de garantia nas contratações de obras, serviços e fornecimentos. […] Art. 98. Nas contratações de obras, serviços e fornecimentos, a garantia poderá ser de até 5% (cinco por cento) do valor inicial do contrato, autorizada a majoração desse percentual para até 10% (dez por cento), desde que justificada mediante análise da complexidade técnica e dos riscos envolvidos.

[3] Lei nº 14.133/2021: […] Art. 58. Poderá ser exigida, no momento da apresentação da proposta, a comprovação do recolhimento de quantia a título de garantia de proposta, como requisito de pré-habilitação. […] § 4º A garantia de proposta poderá ser prestada nas modalidades de que trata o § 1º do art. 96 desta Lei. […] Art. 96. A critério da autoridade competente, em cada caso, poderá ser exigida, mediante previsão no edital, prestação de garantia nas contratações de obras, serviços e fornecimentos. § 1º Caberá ao contratado optar por uma das seguintes modalidades de garantia: I – caução em dinheiro ou em títulos da dívida pública emitidos sob a forma escritural, mediante registro em sistema centralizado de liquidação e de custódia autorizado pelo Banco Central do Brasil, e avaliados por seus valores econômicos, conforme definido pelo Ministério da Economia; II – seguro-garantia; III – fiança bancária emitida por banco ou instituição financeira devidamente autorizada a operar no País pelo Banco Central do Brasil. IV – título de capitalização custeado por pagamento único, com resgate pelo valor total.

[4] Lei nº 14.133/2021: […]  Art. 96. A critério da autoridade competente, em cada caso, poderá ser exigida, mediante previsão no edital, prestação de garantia nas contratações de obras, serviços e fornecimentos. […] Art. 98. Nas contratações de obras, serviços e fornecimentos, a garantia poderá ser de até 5% (cinco por cento) do valor inicial do contrato, autorizada a majoração desse percentual para até 10% (dez por cento), desde que justificada mediante análise da complexidade técnica e dos riscos envolvidos.

[5] A norma é categórica ao disciplinar que, desde que justificado, a habilitação poderá ocorrer antes da fase de apresentação de propostas – vide art. 17. § 1º da Nova Lei de Licitações.

[6] Art. 18.  Após a divulgação do edital de licitação, os licitantes encaminharão, exclusivamente por meio do sistema, a proposta com o preço ou o percentual de desconto, até a data e o horário estabelecidos para abertura da sessão pública. § 1º Na hipótese de a fase de habilitação anteceder as fases referidas nos incisos III e IV do art. 8º, os licitantes encaminharão, na forma e no prazo estabelecidos no caput, simultaneamente os documentos de habilitação e a proposta com o preço ou o percentual de desconto, observado o disposto no § 1º do art. 36 e no § 1º do art. 39. […] Art. 29.  Encerrada a etapa de envio de lances da sessão pública, o agente de contratação ou a comissão de contratação, quando o substituir, realizará a verificação da conformidade da proposta classificada em primeiro lugar quanto à adequação ao objeto estipulado e, observado o disposto nos arts. 33 e 34, à compatibilidade do preço ou maior desconto final em relação ao estimado para a contratação, conforme definido no edital. § 1º Desde que previsto no edital, o órgão ou entidade promotora da licitação poderá, em relação ao licitante provisoriamente vencedor, realizar análise e avaliação da conformidade da proposta, mediante homologação de amostras, exame de conformidade e prova de conceito, entre outros testes de interesse da Administração, de modo a comprovar sua aderência às especificações definidas no termo de referência ou no projeto básico. § 2º O edital de licitação deverá estabelecer prazo de, no mínimo, duas horas, prorrogável por igual período, contado da solicitação do agente de contratação ou da comissão de contratação, quando o substituir, no sistema, para envio da proposta e, se necessário, dos documentos complementares, adequada ao último lance ofertado. […] Art. 39.  A habilitação será verificada por meio do Sicaf, nos documentos por ele abrangidos, quando os procedimentos licitatórios forem realizados por órgãos ou entidades a que se refere o art. 1° ou por aqueles que aderirem ao Sicaf. § 1º Os documentos exigidos para habilitação que não estejam contemplados no Sicaf serão enviados por meio do sistema, quando solicitado pelo agente de contratação, ou comissão de contratação quando o substituir, até a conclusão da fase de habilitação. § 2º Será exigida a apresentação dos documentos de habilitação apenas do licitante vencedor, exceto quando a fase de habilitação anteceder as fases referidas nos incisos III e IV do art. 8º, observado, nesta hipótese, o disposto no § 2º do art. 64 da Lei nº 14.133, de 2021.

[7] Lei nº 8.666/1993: […] Art. 43.  A licitação será processada e julgada com observância dos seguintes procedimentos: I – abertura dos envelopes contendo a documentação relativa à habilitação dos concorrentes, e sua apreciação; II – devolução dos envelopes fechados aos concorrentes inabilitados, contendo as respectivas propostas, desde que não tenha havido recurso ou após sua denegação; III – abertura dos envelopes contendo as propostas dos concorrentes habilitados, desde que transcorrido o prazo sem interposição de recurso, ou tenha havido desistência expressa, ou após o julgamento dos recursos interpostos; IV – verificação da conformidade de cada proposta com os requisitos do edital e, conforme o caso, com os preços correntes no mercado ou fixados por órgão oficial competente, ou ainda com os constantes do sistema de registro de preços, os quais deverão ser devidamente registrados na ata de julgamento, promovendo-se a desclassificação das propostas desconformes ou incompatíveis; V – julgamento e classificação das propostas de acordo com os critérios de avaliação constantes do edital; VI – deliberação da autoridade competente quanto à homologação e adjudicação do objeto da licitação. § 1o A abertura dos envelopes contendo a documentação para habilitação e as propostas será realizada sempre em ato público previamente designado, do qual se lavrará ata circunstanciada, assinada pelos licitantes presentes e pela Comissão. § 2o Todos os documentos e propostas serão rubricados pelos licitantes presentes e pela Comissão. § 3o É facultada à Comissão ou autoridade superior, em qualquer fase da licitação, a promoção de diligência destinada a esclarecer ou a complementar a instrução do processo, vedada a inclusão posterior de documento ou informação que deveria constar originariamente da proposta. § 4º O disposto neste artigo aplica-se à concorrência e, no que couber, ao concurso, ao leilão, à tomada de preços e ao convite, facultada, quanto a este último, a publicação na imprensa oficial. § 4o O disposto neste artigo aplica-se à concorrência e, no que couber, ao concurso, ao leilão, à tomada de preços e ao convite.                  (Redação dada pela Lei nº 8.883, de 1994) § 5o Ultrapassada a fase de habilitação dos concorrentes (incisos I e II) e abertas as propostas (inciso III), não cabe desclassificá-los por motivo relacionado com a habilitação, salvo em razão de fatos supervenientes ou só conhecidos após o julgamento. § 6o Após a fase de habilitação, não cabe desistência de proposta, salvo por motivo justo decorrente de fato superveniente e aceito pela Comissão.

Decreto Federal nº 10.024, de 20 de setembro de 2019: […] Art. 26.  Após a divulgação do edital no sítio eletrônico, os licitantes encaminharão, exclusivamente por meio do sistema, concomitantemente com os documentos de habilitação exigidos no edital, proposta com a descrição do objeto ofertado e o preço, até a data e o horário estabelecidos para abertura da sessão pública.

[8] Lei nº 8.666/1993: […] Art. 31.  A documentação relativa à qualificação econômico-financeira limitar-se-á a: I – balanço patrimonial e demonstrações contábeis do último exercício social, já exigíveis e apresentados na forma da lei, que comprovem a boa situação financeira da empresa, vedada a sua substituição por balancetes ou balanços provisórios, podendo ser atualizados por índices oficiais quando encerrado há mais de 3 (três) meses da data de apresentação da proposta; II – certidão negativa de falência ou concordata expedida pelo distribuidor da sede da pessoa jurídica, ou de execução patrimonial, expedida no domicílio da pessoa física; III – garantia, nas mesmas modalidades e critérios previstos no “caput” e § 1o do art. 56 desta Lei, limitada a 1% (um por cento) do valor estimado do objeto da contratação.

[9] TCU – Acórdão nº 2552/2017 Plenário: […] Licitação. Qualificação econômico-financeira. Garantia da proposta. Momento. É irregular a exigência de prestação de garantia da proposta antes da data de apresentação dos documentos de habilitação, pois não encontra amparo na Lei 8.666/1993 e permite o conhecimento antecipado das empresas que efetivamente participarão do certame, o que pode comprometer o caráter competitivo da licitação.

[10] BRASIL. Tribunal de Contas da União. Licitações & Contratos: Orientações e Jurisprudência do TCU / Tribunal de Contas da União. 5ª Edição, Brasília: TCU, Secretaria-Geral da Presidência, 2023. Pág. 503

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