Comentando o TCU nº 6. Acórdão nº 2518/2022 – Plenário. 21.01.2023.
Jurisprudência:
Acórdão 2518/2022 Plenário (Representação, Relator Ministro Jorge Oliveira) Contrato Administrativo.
Pagamento antecipado. Requisito. Justificativa. Garantia.
É irregular a realização, sem a justificativa prévia e sem as devidas garantias, de pagamento antecipado, por contrariar o art. 62 da Lei 4.320/1964.
Comentário LCT:
A Lei nº 4.320, de 17 de março de 1964, ao estatuir as Normas Gerais de Direito Financeiro para elaboração e controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal, define as etapas da despesa. São elas: empenho, liquidação e pagamento. Para a melhor compreensão, importante examinar a definição de tais etapas:
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- o empenho de despesa é o ato emanado de autoridade competente que cria para o Estado obrigação de pagamento, o qual não poderá exceder o limite dos créditos concedidos. Para cada empenho será extraída uma nota de empenho que indicará o nome do credor, a representação e a importância da despesa bem como a dedução desta do saldo da dotação própria[1]. A nota de empenho é um dos documentos que pode substituir o contrato[2];
- a liquidação da despesa consiste na verificação do direito adquirido pelo credor, para apurar a origem e o objeto, a importância exata a pagar e a quem se deve pagar a importância;[3] e
- o pagamento da despesa é a contrapartida do objeto adequadamente executado pelo particular, para extinguir a obrigação, que somente será efetuado quando ordenado após sua regular liquidação. Ou seja, a ordem de pagamento é o despacho exarado por autoridade competente, determinando que a despesa seja paga.[4]
Cabe ressaltar que a Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, disciplina que o prazo para pagamento, em regra[5], não poderá exceder 30 (trinta) dias.[6] Já a Lei 14.133, de 1º de abril de 2021 (Nova Lei de Licitações), não detalha o prazo para pagamento, dispondo que o edital e o contrato deverão fixar.[7] Contudo, estabelece que é causa de rescisão do contrato pelo Contratado, atraso no pagamento superior a 2 (dois) meses.
Além disso, é regra categórica a exigência de que a Administração Pública respeite a ordem cronológica de pagamento.[8]
Nesse sentido, verifica-se que em contratos administrativos firmados entre a Administração Pública e particulares, a regra é que o pagamento somente seja realizado após a execução do objeto contratado, desde que constatado o recebimento provisório e definitivo, por parte dos agentes públicos responsáveis, nos termos definidos na Lei de Licitações[9] e no art. 62 da Lei nº 4.320/1964.[10]
Ocorre que, o art. 65, da Lei nº 4.320/1964 dispõe que, em casos excepcionais, o pagamento da despesa ocorrerá por meio de adiantamento.[11]
Frisa-se que o pagamento antecipado, como regra, também é vedado pela Nova Lei de Licitações, sendo admitido somente em situações excepcionais em que fique devidamente demonstrada a existência de interesse público[12], considerado como relevante economia aos cofres públicos ou condição essencial para aquisição do bem ou serviço.
Segundo a jurisprudência do Tribunal de Contas da União – TCU, essa prática só deveria ocorrer em situações atípicas e devidamente justificadas, ou mediante a imposição de garantias suficientes. Por meio do Acórdão nº 2856/2019 – Primeira Câmara, a Corte de Contas elencou os requisitos para a antecipação de pagamento:
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- previsão no ato convocatório;
- estudo fundamentado comprovando a necessidade e economicidade da medida; e
- fixação de garantias específicas e suficientes que resguardem a Administração dos riscos inerentes à operação.
Como exemplos de exceção, previstos nas normas, podem ser citadas as contratações de pequeno valor[13] ou aquelas que o mercado privado usualmente exija o pagamento antecipado.[14]
O TCU, com base nos normativos e julgados expostos acima, proferiu entendimento, no acórdão em evidência, reforçando a posição de que é irregular a realização de pagamento antecipado sem a justificativa prévia e sem as devidas garantias, por contrariar o art. 62 da Lei 4.320/1964.
A Corte de Contas entende que a antecipação de pagamentos veio a ser concebida pelo legislador como providência necessária nos casos em que tal medida constitua condição indispensável para a obtenção do bem ou do serviço almejado pela Administração. [Acórdão 2518/2022 Plenário].
[1] Lei nº 4.320, de 17 de março de 1964. Art. 58. O empenho de despesa é o ato emanado de autoridade competente que cria para o Estado obrigação de pagamento pendente ou não de implemento de condição. Art. 59 – O empenho da despesa não poderá exceder o limite dos créditos concedidos. […] Art. 61. Para cada empenho será extraído um documento denominado “nota de empenho” que indicará o nome do credor, a representação e a importância da despesa bem como a dedução desta do saldo da dotação própria
[2] Lei nº 8.666/1993. Art. 62. O instrumento de contrato é obrigatório nos casos de concorrência e de tomada de preços, bem como nas dispensas e inexigibilidades cujos preços estejam compreendidos nos limites destas duas modalidades de licitação, e facultativo nos demais em que a Administração puder substituí-lo por outros instrumentos hábeis, tais como carta-contrato, nota de empenho de despesa, autorização de compra ou ordem de execução de serviço.
Lei nº 14.133/2021. Art. 95. O instrumento de contrato é obrigatório, salvo nas seguintes hipóteses, em que a Administração poderá substituí-lo por outro instrumento hábil, como carta-contrato, nota de empenho de despesa, autorização de compra ou ordem de execução de serviço […].
[3] Lei nº 4.320, de 17 de março de 1964: […] Art. 63. A liquidação da despesa consiste na verificação do direito adquirido pelo credor tendo por base os títulos e documentos comprobatórios do respectivo crédito. § 1° Essa verificação tem por fim apurar: I – a origem e o objeto do que se deve pagar; II – a importância exata a pagar; III – a quem se deve pagar a importância, para extinguir a obrigação. § 2º A liquidação da despesa por fornecimentos feitos ou serviços prestados terá por base: I – o contrato, ajuste ou acôrdo respectivo; II – a nota de empenho; III – os comprovantes da entrega de material ou da prestação efetiva do serviço.
[4] Lei nº 4.320, de 17 de março de 1964: […] Art. 62. O pagamento da despesa só será efetuado quando ordenado após sua regular liquidação. […] Art. 64. A ordem de pagamento é o despacho exarado por autoridade competente, determinando que a despesa seja paga. Parágrafo único. A ordem de pagamento só poderá ser exarada em documentos processados pelos serviços de contabilidade.
[5] TCU. Acórdão nº 4726/2015 – 2ª Câmara: […] 1.6.1. Com base no art. 7º da Resolução – TCU 265/2014, dar ciência à Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária sobre as seguintes impropriedades, identificadas no Termo de Referência do Pregão Eletrônico 017/2015 – Embrapa Cenargen, para que sejam adotadas medidas internas com vistas à prevenção de ocorrência de outras semelhantes: […] 1.6.1.2.fixação de prazo de pagamento, decorrentes de despesas cujos valores não ultrapassem o limite de que trata o art. 24, II, e § 1º, da Lei 8.666/1993, em período superior a cinco dias úteis, contados da apresentação da fatura, em desacordo com o art. 5º, §3º, da Lei 8.666/1993, em razão da natureza obrigatória desse dispositivo legal.
[6] Lei nº 8.666/1993. Art. 5o Todos os valores, preços e custos utilizados nas licitações terão como expressão monetária a moeda corrente nacional, ressalvado o disposto no art. 42 desta Lei, devendo cada unidade da Administração, no pagamento das obrigações relativas ao fornecimento de bens, locações, realização de obras e prestação de serviços, obedecer, para cada fonte diferenciada de recursos, a estrita ordem cronológica das datas de suas exigibilidades, salvo quando presentes relevantes razões de interesse público e mediante prévia justificativa da autoridade competente, devidamente publicada. […] § 3o Observados o disposto no caput, os pagamentos decorrentes de despesas cujos valores não ultrapassem o limite de que trata o inciso II do art. 24, sem prejuízo do que dispõe seu parágrafo único, deverão ser efetuados no prazo de até 5 (cinco) dias úteis, contados da apresentação da fatura. Art. 40. O edital conterá no preâmbulo o número de ordem em série anual, o nome da repartição interessada e de seu setor, a modalidade, o regime de execução e o tipo da licitação, a menção de que será regida por esta Lei, o local, dia e hora para recebimento da documentação e proposta, bem como para início da abertura dos envelopes, e indicará, obrigatoriamente, o seguinte: […] XIV – condições de pagamento, prevendo: a) prazo de pagamento não superior a trinta dias, contado a partir da data final do período de adimplemento de cada parcela; b) cronograma de desembolso máximo por período, em conformidade com a disponibilidade de recursos financeiros;
[7] Lei nº 14.133/2021. Art. 92. São necessárias em todo contrato cláusulas que estabeleçam: […] V – o preço e as condições de pagamento, os critérios, a data-base e a periodicidade do reajustamento de preços e os critérios de atualização monetária entre a data do adimplemento das obrigações e a do efetivo pagamento; VI – os critérios e a periodicidade da medição, quando for o caso, e o prazo para liquidação e para pagamento;
[8] Lei nº 8.666/1993. Art. 5o Todos os valores, preços e custos utilizados nas licitações terão como expressão monetária a moeda corrente nacional, ressalvado o disposto no art. 42 desta Lei, devendo cada unidade da Administração, no pagamento das obrigações relativas ao fornecimento de bens, locações, realização de obras e prestação de serviços, obedecer, para cada fonte diferenciada de recursos, a estrita ordem cronológica das datas de suas exigibilidades, salvo quando presentes relevantes razões de interesse público e mediante prévia justificativa da autoridade competente, devidamente publicada.
Lei nº 14.133/2021. Art. 141. No dever de pagamento pela Administração, será observada a ordem cronológica para cada fonte diferenciada de recursos, subdividida nas seguintes categorias de contratos: I – fornecimento de bens; II – locações; III – prestação de serviços; IV – realização de obras. § 1º A ordem cronológica referida no caput deste artigo poderá ser alterada, mediante prévia justificativa da autoridade competente e posterior comunicação ao órgão de controle interno da Administração e ao tribunal de contas competente, exclusivamente nas seguintes situações: I – grave perturbação da ordem, situação de emergência ou calamidade pública; II – pagamento a microempresa, empresa de pequeno porte, agricultor familiar, produtor rural pessoa física, microempreendedor individual e sociedade cooperativa, desde que demonstrado o risco de descontinuidade do cumprimento do objeto do contrato; III – pagamento de serviços necessários ao funcionamento dos sistemas estruturantes, desde que demonstrado o risco de descontinuidade do cumprimento do objeto do contrato; IV – pagamento de direitos oriundos de contratos em caso de falência, recuperação judicial ou dissolução da empresa contratada; V – pagamento de contrato cujo objeto seja imprescindível para assegurar a integridade do patrimônio público ou para manter o funcionamento das atividades finalísticas do órgão ou entidade, quando demonstrado o risco de descontinuidade da prestação de serviço público de relevância ou o cumprimento da missão institucional.
[9] Lei nº 8.666/1993: […] Art. 73. Executado o contrato, o seu objeto será recebido: I – em se tratando de obras e serviços: a) provisoriamente, pelo responsável por seu acompanhamento e fiscalização, mediante termo circunstanciado, assinado pelas partes em até 15 (quinze) dias da comunicação escrita do contratado; b) definitivamente, por servidor ou comissão designada pela autoridade competente, mediante termo circunstanciado, assinado pelas partes, após o decurso do prazo de observação, ou vistoria que comprove a adequação do objeto aos termos contratuais, observado o disposto no art. 69 desta Lei; II – em se tratando de compras ou de locação de equipamentos: a) provisoriamente, para efeito de posterior verificação da conformidade do material com a especificação; b) definitivamente, após a verificação da qualidade e quantidade do material e conseqüente aceitação. § 1o Nos casos de aquisição de equipamentos de grande vulto, o recebimento far-se-á mediante termo circunstanciado e, nos demais, mediante recibo. § 2o O recebimento provisório ou definitivo não exclui a responsabilidade civil pela solidez e segurança da obra ou do serviço, nem ético-profissional pela perfeita execução do contrato, dentro dos limites estabelecidos pela lei ou pelo contrato. § 3o O prazo a que se refere a alínea “b” do inciso I deste artigo não poderá ser superior a 90 (noventa) dias, salvo em casos excepcionais, devidamente justificados e previstos no edital. § 4o Na hipótese de o termo circunstanciado ou a verificação a que se refere este artigo não serem, respectivamente, lavrado ou procedida dentro dos prazos fixados, reputar-se-ão como realizados, desde que comunicados à Administração nos 15 (quinze) dias anteriores à exaustão dos mesmos. Art. 74. Poderá ser dispensado o recebimento provisório nos seguintes casos: I – gêneros perecíveis e alimentação preparada; II – serviços profissionais; III – obras e serviços de valor até o previsto no art. 23, inciso II, alínea “a”, desta Lei, desde que não se componham de aparelhos, equipamentos e instalações sujeitos à verificação de funcionamento e produtividade. Parágrafo único. Nos casos deste artigo, o recebimento será feito mediante recibo. Art. 75. Salvo disposições em contrário constantes do edital, do convite ou de ato normativo, os ensaios, testes e demais provas exigidos por normas técnicas oficiais para a boa execução do objeto do contrato correm por conta do contratado. Art. 76. A Administração rejeitará, no todo ou em parte, obra, serviço ou fornecimento executado em desacordo com o contrato.
[10] Lei nº 4.320/1964: […] Art. 62. O pagamento da despesa só será efetuado quando ordenado após sua regular liquidação.
[11] Lei nº 4.320/1964: […] Art. 65. O pagamento da despesa será efetuado por tesouraria ou pagadoria regularmente instituídos por estabelecimentos bancários credenciados e, em casos excepcionais, por meio de adiantamento.
[12] Lei nº 14.133/2021. Art. 145. Não será permitido pagamento antecipado, parcial ou total, relativo a parcelas contratuais vinculadas ao fornecimento de bens, à execução de obras ou à prestação de serviços. § 1º A antecipação de pagamento somente será permitida se propiciar sensível economia de recursos ou se representar condição indispensável para a obtenção do bem ou para a prestação do serviço, hipótese que deverá ser previamente justificada no processo licitatório e expressamente prevista no edital de licitação ou instrumento formal de contratação direta.
[13] Lei nº 8.666/1993: […] Art. 60. Os contratos e seus aditamentos serão lavrados nas repartições interessadas, as quais manterão arquivo cronológico dos seus autógrafos e registro sistemático do seu extrato, salvo os relativos a direitos reais sobre imóveis, que se formalizam por instrumento lavrado em cartório de notas, de tudo juntando-se cópia no processo que lhe deu origem. Parágrafo único. É nulo e de nenhum efeito o contrato verbal com a Administração, salvo o de pequenas compras de pronto pagamento, assim entendidas aquelas de valor não superior a 5% (cinco por cento) do limite estabelecido no art. 23, inciso II, alínea “a” desta Lei, feitas em regime de adiantamento.
[14] Lei nº 8.666/1993: […] Art. 15. As compras, sempre que possível, deverão: I – atender ao princípio da padronização, que imponha compatibilidade de especificações técnicas e de desempenho, observadas, quando for o caso, as condições de manutenção, assistência técnica e garantia oferecidas; II – ser processadas através de sistema de registro de preços; III – submeter-se às condições de aquisição e pagamento semelhantes às do setor privado;